25 março 2016

Comer, pensar, amar... {A Cozinha do Pensamento}




                A gastronomia é a arte de condimentar os alimentos para produzir felicidade. Há três maneiras de comer, assim como há três modos de viver ou de procurar este bem-estar primário que todos desejamos. Comer de tudo até saciar-se é o proceder básico que define muitas espécies animais, começando pela nossa. Um segundo modo de comer aposta em selecionar os alimentos e transformá-los num refinamento que, ao mesmo tempo, tem valor nutritivo e representa uma autêntica carícia para os sentidos. No entanto, em terceiro lugar, encontramos uma prática mais arriscada, reservada a verdadeiros aventureiros: a intrepidez de degustar coisas novas, nunca antes saboreadas pelo paladar humano.


                Dá ótica científica, os seres humanos são onívoros. Como outros animais, ingerimos, segundo a expressão de Marvin Harris, “secreções rançosas de glândulas mamárias, fungos ou rochas (ou, se preferirem os eufemismos, queijo, champignon e sal)1”. E não fazemos de forma moderada: agarramos tudo o que encontramos pela frente e devoramos com avidez. Basta entrar num estabelecimento de fast-food para comprovar a veracidade dessa afirmação. Não podemos nos esquivar de nossa herança genética. Gerações de carniçais, desde aquele macaco louco que decidiu descer de uma árvore para buscar comida, precederam-nos neste mesmo caminho.

                (...)


                Para pensar, é preciso comer, como lembra Descartes. Porque, senão, é bem provável que só nos dediquemos a discorrer sobre como fartar o estômago. A filosofia é o engenho de cozinhar as ideias para se obter perguntas. Há três maneiras de pensar, como há três modos de comer ou de jogar bocha.

  1.  Harris, Marvin. Bueno para comer (Madri: Alianza, 1989)


In: REDÓN, Josep Muñoz. A Cozinha do Pensamento.  São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008. págs 21 e 23

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