09 julho 2021

Menu-lunação: CÂNCER

Cuscuz paulista 

Arroz branco 

Gumbo 

Compota de fruta

“Comida é um jeito de voltar.”


        Tá sentindo esse cheirinho? Ainda não? Vem mais pra cá. Hmnmm, parece que vem ali da casa 5. Oba! Se vem da casa 5 é coisa boa! A casa 5, entre outras atribuições, é a dos prazeres. 

        Dá pra sentir o cheiro bom já no Ascendente, a porta de entrada do mapa, pela lufada limpa do trígono. Quando você entra, é arrebatado pelo bafo de conforto e, puxa, não é só água na boca, esse cheiro não te lembra alguma coisa?… parque de diversão… coisa de infância com certeza… pastel, acho. Ou sonho, joelho, cueca virada... Ouço a risadinha vindo da casa 4. Cueca virada é um nome bem engraçado mesmo. Seu aspecto não fica atrás.

        Este aroma fala coisas profundas, e fala muito alto; ainda assim os cozinheiros parecem um tanto reservados, tratando das cozinhanças, em movimentos rápidos e contidos, quase mudos, fechados em suas conchas, devotos em volta da caçarola no fogo.


Signo de Câncer

        “Câncer, o castelo da Lua, é como a orla da praia acariciada pelo vai e vem do oceano que, no constante pulsar de suas águas, avança delicadamente pela terra para depois retornar ao seu infinito. Câncer é cardinal e marca o início de uma das estações do ano, sendo este um signo feminino e aquático que reage ao mundo pelo impulso iniciador.

        Câncer é o caranguejo que, assim como o movimento do mar, é capaz de ir em direção ao mundo, mas se sente mais confortável quando volta para a casa. Com suas pinças, o caranguejo agarra o que estiver ao seu redor levando as coisas para perto de si, e uma vez que as segura, tem dificuldade de soltar. A imagem do caranguejo simboliza bem o apego e o forte vínculo das memórias encontrado no signo da Lua.

        O caranguejo possui uma carapaça dura quase impenetrável que por dentro guarda seu corpo mole. De tempos em tempos, isola-se para trocar a armadura que o protege. Este é um período no qual o crustáceo se encontra em imensa vulnerabilidade, por isso é importante estar sozinho em seu esconderijo. O caranguejo também é um animal extremamente fértil capaz de deixar uma grande prole ao longo de sua existência. Habita os mangues repletos de matéria orgânica para sua alimentação, uma imagem da fartura.

        Câncer é o líquido amniótico que envolve o bebê no útero, e também o seio que irá nutri-lo. Agir em Câncer é criar e acompanhar, é manter laços de dependência que, quando cortados, torna-o vazio.

        Câncer é o mítico Ascendente da Terra na carta consagrada como Thema Mundi. Câncer é o conforto e a hospitalidade, de modo que todos os planetas só podem se exaltar em signos que formam aspecto ou conjunção a ele.”[1]


Início

        Há quem diga que o início de tudo foi um som. Uma vibração. No Thema Mundi[2], como colocou o Guilherme, Câncer era o signo do Ascendente. Hoje, Câncer corresponde à casa Cinco, e a vibração muda da lunação é amplificada por Júpiter no Ascendente, já que o trígono não provoca ruído nem mal-entendidos. O bater das asas de uma arraia no fundo do mar provoca uma onda no Ascendente.

        Faz sentido pensarmos em começos. A casa Cinco, onde acontece o encontro da Lua com o Sol, é a casa dos filhos. E das crias todas: o trabalho criativo honesto, ensinou Luigi Pareyson, resulta em um objeto com autonomia. O livro, a fotografia, o desenho, estão aí. Eu coloco também a comida porque tenho essa relação com ela. Também estão prazeres e estão festas, essa é a casa de júbilo da Vênus, a pequena benéfica.

        Além dos luminares e de Júpiter, no mapa da lunação é visível o Mercúrio na casa 4, em Gêmeos. Ele faz questão de acrescentar que o som pode ser percebido de outras maneiras, não só através da audição. Pra começar, o corpo todo sente a vibração das ondas sonoras. Isso mesmo o nosso corpo distraído. Mas os caranguejos vão além: eles têm antenas que sentem a vibração do som e das ondas das água, e captam também os cheiros e sabores! Ah, sim, seus olhos ficam nas antenas, tudo tão pertinho.

        E nem era isso que Mercúrio queria dizer a princípio. Era que a mente também pode ler o som, e faz isso na Matemática. A matemática decifra as ondas (as ondas do som e as ondas do mar, pois), ela escreve a música, e também faz a tradução de outras manifestações na natureza: nos fractais da formação das plantas, algumas bem fáceis de percebermos, como as samambaias, ou na clássica demonstração da proporção áurea no formato de algumas conchas[3], ou na dança da areia da praia sobre o prato de Chladni[4].

        Várias relações são apresentadas nesta sequência de vídeos (em inglês).[5]

        Por mais que Mercúrio possa negar hoje, enquanto está todo arejado em Gêmeos, quando ele entrar em Câncer e também fizer trígono com Júpiter, é capaz de interessar-se por geometria sagrada, e de ficar horas a admirar embevecido a divisão celular, suas relações com estrelas, e os números com os quais fez belos malabarismos, tão inteligentes, revelarão uma realidade numinosa.


Início 

        A minha história com esse prato começou com um som. Uma amiga me mandou um album[6] que por algum motivo me lembrou que existe um prato chamado gumbo. Eu falei pra ela: vamos fazer uma comida que se chama gumbo? E procuramos instruções pela internet.

        Foi durante a pandemia então fizemos juntas por vídeo: eu e minha panela na minha casa, ela e sua panela na casa dela. E as reações são aquilo mesmo do comecinho desse texto: mas do que é esse cheiro tão maravilhoso? Isso me lembra algo muito bom![7]

        Apesar do gumbo ser um prato de outra região, de outra colonização, é um dos aromas mais confortativos que eu já senti numa cozinha. E cancerianamente preparado numa (uterina) caçarola.


GUMBO 

[gãmbo, com um B bem gostoso na boca]


        É um bom som pra abraçar essa lunação. Reverbera e acolhe como Júpiter domiciliado em Peixes no Ascendente do mapa, em trígono com os luminares em outro signo de água, Câncer, o signo do mangue. Tem a gravidade do Saturno domiciliado e jubilado, que se opõe à Vênus, presa entre os maléficos na casa da labuta fudida, da escravidão, indo ao encontro de um Marte seco e jubilado. E Mercúrio, que está em ar mas sabe onde tá pisando, e é na casa 4, a casa das raízes ancestrais, vem com esse soul que mais parece um mantra: gum-bo.

        Pois, gumbo é um prato da culinária cajun. Sim, só tem nome suculento nessa culinária (mais um: jambalaya) e os pratos também são de encher a pança só de ver a foto. A culinária cajun se desenvolveu no sul dos Estados Unidos, com bastante referência dos países africanos (a República de Benim é mostrada em High on the Hog), com influência espanhola e francesa, via colonização canadense.

        Percebi algumas semelhanças com, por exemplo, a nossa feijoada, a presença de arroz com feijão, bastante tempero e pimenta, comidas caldosas, grossas e ricas.

        No mês passado assisti High on the Hog, e babei muito mais sobre essa culinária. Já no comecinho do primeiro episódio é apresentado o Amiwo, um prato com um enformadinho de tomate e farinha de milho, e eu pulei no sofá: o vô do Cuscuz!!

        O cuscuz paulista é uma das minhas comidas mais queridas da vida. Ele sempre esteve nas festas, churrascos da família (que era formada por duas famílias nucleares: pai, mãe e irmão e eu numa casa, tia, tio e prima em outra — histórias de pequenas diásporas). Tive sorte de aprender o preparo cheio de detalhes com a tia cuscuzeira mas, como dizem, cada cozinheira tem sua mão, e igual igualzinho é difícil ficar, mesmo com as anotações detalhadas e seguidas à risca. Então, depois que a tia morreu a prima e eu passamos anos trocando impressões e novas descobertas, e muitas fotos de cuscuz com a clássica legenda: “adivinha o que eu tô fazendo/comendo! <3


        Esse ano a prima morreu e, para a ocasião, num ritual solitário aqui longe, preparei um cuscuz que ficou dos meus melhores porque, tenho certeza, não preparei sozinha. Tinha uma mão na minha mão. Obrigada, Mercúrio. Obrigada, tia. 


        Por outro lado — e é naturalmente assim mesmo com as receitas e as línguas — sou traidora da receita “original”: há mais de dez anos deixei de colocar a sardinha, e há uns quatro deixei de usar os ovos cozidos. E é sempre bom pensar nos passos dos processos, passos que a gente dá às vezes automaticamente. A receita é uma referência mas cada execução sempre abre escolhas. Com o tempo alguns valores mudam de peso e se sobrepõem aos outros. Como mostra a história — macro e micro, fractal — a gente não precisa ficar reproduzindo o erro só porque foi inaugurado e repetido, colocado como normal. Pessoas e animais não devem ser escravizados. Cada mudança nessa “normalidade” gera algum ruído e resistência, mas a harmonia se estabelece novamente.

        Em culinária, a palavra “original” há de ser sempre usada entre aspas. A gente pode pensar no cuscuz paulista como uma corruptela do cuscuz baiano, que leva camarões. Na sua adaptação paulista se tornou mais prático e mais parecida com São Paulo, lugar de velocidade, destino de tantas diásporas. Levei um susto quando percebi que praticamente todos os seus ingredientes são vendidos em conserva e podem ficar guardados em uma despensa ou, gosto de imaginar, em armários de fórmica dos anos 60.

        E o cuscuz baiano, pode ser dito original? Algum, qualquer um, pode? O enformadinho do Amiwo pode? O milho é americano então, quem é o vô do Amiwo?[8]

        O cuscuz é cheio de sabores, como o gumbo. Então sugiro como entrada. Você pode deixá-lo pronto com antecedência, na hora de servir é só desenformar e cortar. Eu recomendo até deixar pronto na véspera, e servir antes de fazer o gumbo. Assim, afastados, seus sabores e suas pimentas não competem entre si; além disso o preparo do gumbo é longo — não comece esse processo com fome! Coma cuscuz.

        O arroz branco é ótimo para acompanhar o gumbo ricão. Mesmo para a sobremesa escolhi algo muito simples: compota de fruta em calda. Não me refiro ao pêssego em lata, levinho, ralinho, delicado, mas um doce caseiro carregado de calda grossa. Açúcar é uma marca dessa nossa história[9]. Eu dei sorte de conseguir mamão verde e fiz dele. Ficou perfeito na composição, acredito que por seu toque floral. Sou suspeita, mamão verde sempre foi minha compota caseira preferida. Mas que autobiográfico está me saindo este menu, eu mesma estou surpresa com esses caranguejinhos falando tão alto, coisas tão profundas, através da linguagem deliciosa de casa 5: o desejo. E Mercúrio ali puxando pérolas da casa 4, da ancestralidade em vários níveis.

        Anotação para esta lunação: escutemos as vontades dos nossos caranguejinhos.


A parte de chumbo

        Mercúrio dá mais um aviso: não são vistos[10] pelo Ascendente: Saturno, Marte e Vênus, mas isso não quer dizer que eles não operem pesadamente.

        E faz sentido voltar de novo ao começo: o mar.

        Desta vez não o mar de Júpiter domiciliado diluindo alegremente as fronteiras, mas o mar de Marte jubilado, de Saturno jubilado, que não hesitam em arrancar pessoas da sua terra, da sua sociedade, dos seus cheiros, abarrotá-las num navio insalubre, presas por ferros, apavoradas, revoltadas e impotentes, para atravessar o oceano e serem vendidas como mercadoria. Marte as arranca repentinamente, Saturno as arranca definitivamente. E Vênus.

        E Vênus. Não te lembra a história de Pandora? Na sua caixa, monstros, males, desgraceiras… e a esperança.

        Veja, como é possível?, lá no fundo de um roux, que não é mais do que óleo e farinha, o primeiro passo do preparo do gumbo, estão guardadas tantas memórias. E memória faz a gente lembrar quem é, e isso dá potência e é, portanto, benéfica pois afirma a vida. A parte árabe da Memória[11] deste mapa está na casa 12. Cada um sente a história que carrega. Desde a história pessoal até aquela lá de trás que te passa (ou te empurra) sem você nem saber. Saturno, dispositor da parte da Memória também ali, domiciliado, jubilado, andando para trás; ele tem as chaves para abrir alguma porta, se for o caso. Aqui a gente abre com cuidado, porque não há nada para ser subestimado na casa 12; a gente abre com as especiarias e com a Santíssima Trindade — esse preparo cujo nome soa como um seguro, claro, mas confesso: se eu tivesse que atribuir associações de planetas aos componentes da Santíssima Trindade aos planetas deste mapa, Saturno certamente seria um deles.

        Enfim, essas pessoas, quando foram sequestradas, trouxeram Vênus com elas, no mapa da lunação uma Vênus em Leão. Escuta essa Vênus em High on the Hog: “É importante as pessoas perceberem que o que os escravos faziam e comiam não tinha relação com o rótulo que recebiam. Eles se achavam dignos de uma refeição decente, de uma refeição preparada de esposa para marido, e vice-versa. De pais para filhos, de avós para netos”.[12]

        Essas pessoas chegaram aqui com seus sabores e memórias, e precisaram se adaptar e adaptar esse vocabulário culinário com os ingredientes disponíveis. Não há ninguém que faria isso tão bem quanto este Mercúrio domiciliado, mutável, quase no fundo do céu em trígono com Saturno e a parte árabe da Memória, e em sextil com uma Vênus que não vai abrir mão da sua identidade.

        E ainda que eu tenha trazido este tema de diáspora e exílio, não posso deixar de notar que quatro dos sete planetas deste mapa estão domiciliados, estão muito em casa. Também noto como me senti em casa com o cheiro do preparo de um prato que nunca tinha comido antes.

        Sobre essas duas percepções, mesmo correndo o risco de não fazer sentido aparente, trago mais uma fala da série:

        “Chamamos nossa comida de soul. Somos o único povo que batizou a própria culinária com o nome de algo invisível que você pode sentir, como o amor de Deus. É algo completamente transcendental. É uma conexão entre nós e os nossos mortos, e entre nós e aqueles que nascerão."



Notas:

[1] Guilherme de Carli, Nodo Norte Astrologia e no Instagram como @nodonorteastrologia

[2] mais sobre o Thema Mundi aqui

[3] por exemplo:









daqui












[4] Esse mercúrio explica https://www.youtube.com/watch?v=xjQH9Zx-jsY 

e mais um porque é legal demais https://www.youtube.com/watch?v=wvJAgrUBF4w

E pra quem já vestiu o suéter canceriano 

https://www.youtube.com/watch?v=OLNFrxgMJ6E

[5] The majesty of Music + Math

 https://www.youtube.com/watch?v=V5tUM5aLHPA&list=PLZlVBTf7N6GoLgWE7abe wWPGKu2mdXepI

E como não lembrar do Google Doodle em homenagem a Oskar Fischinger https://www.google.com/logos/doodles/2017/fischinger/fischinger17.9.html?hl=pt-BR 

[6] Fronteiriça, de Roseane Santos 

https://open.spotify.com/album/3ZM9Glp8if4SonemZnLoYE?si=FvnG_HSCS5Oo2F R1OkQN_g&utm_source=whatsapp&dl_branch=1 

[7] Não foi só aqui. Pouco depois encontrei esse relato semelhante sobre duas pessoas preparando gumbo meio sem saber do que se tratava:

        “My brother Mike was visiting us this past weekend, and we were reeling from the death Saturday morning of Jimmy Koikos, co-owner with his brother Nicky, of The Bright Star. On Saturday afternoon, I asked Mike what he wanted to do on Sunday, his last day with us.

        ‘Let’s cook some gumbo’, he said. (...)

        I am gluten free, but King Arthur’s gluten free flour works very well — exact proportion to the oil, stirring constantly, and after 25 minutes or so, we had a deep chocolate roux.

        Then we tossed in the chopped onions. 

        ‘Oh that aroma’, Mike said.

        ‘Yeah it reminds me of the smell at the old Newstand on Bessemer’s 19th Street.’

        ‘What did they cook there?’ Mike asked.

        ‘I don’t know. Roasted peanuts? Popcorn, or maybe it was the aroma of all that pulp? All I know is that when the onions hit the roux, I always think of that Newstand where we bought our Batman’s and Spider-Man’s!’

        He smiled. 

        ‘Yeah.’”

daqui

[8] Pelo que entendi, o amiwo é composto também por um enformado à base de molho de tomate engrossado com farinha de milho. Mais grosso que um pirão. como o cuscuz paulista, é colocado em uma forminha ainda quente e, quando frio e sólido, desenformado

[9] “Quando outro homem de superior talento, ou, talvez, de gênio — o padre Antônio Vieira —, identificou o Brasil com o açúcar — ou com o negro a serviço do açúcar —, procedeu com igual sabedoria sociológica. Terra, durante anos decisivos, principalmente do açúcar, era natural que o açúcar influísse histórica e ecologicamente sobre o paladar do brasileiro, tornando-o entusiasta de doces e de bolos. Descendente de português, por sua vez mesclado, no sangue e na cultura, de árabe e de mouro, era igualmente de esperar que, desses antepassados, o brasileiro herdasse um gosto, é possível que excessivo, pelos doces e pelos bolos. Herdou-o. E onde essa ecologia, essa herança cultural, essa circunstância social mais fortemente se uniram para fazer do Brasil, nos dias decisivos de sua formação, uma terra condicionada em sua cultura, em geral, em sua doçaria, em particular, e também em sua paisagem, pela presença da cana, do engenho e da economia do alúcar, foi no Nordeste: tão do açúcar, tão do negro importado em função do açúcar, tão do engenho de açúcar introduzido pelo colonizador português.

(...)

        Pois a cana-de-açúcar introduzida no Brasil pelo colonizador português alcançou um tal esplendor de viço no massapê do Nordeste — na então Nova Lusitânia — que o açúcar fabricado com o suco da cana regional nos engenhos do mesmo Nordeste projetou de súbito o Brasil no mercado europeu. O açúcar introduzido pelo português na sua colônia americana encontrara naquele massapê solo verdadeiramente ideal para a sua floração. Um casamento de amor uniu o adventício à terra umidamente tropical. À terra e ao ar em certos dias quase água, de tão úmido. O açúcar assim produzido logo superou, em importância, a madeira de tinta que vinha dando valor econômico ao Brasil na Europa; e que já lhe dera o próprio nome: Brasil. O açúcar passou a dar renome ao chamado Brasil. Mais do que nome: renome. O Brasil, terra do açúcar, tornou-se mais famoso que o Brasil, terra de madeira de tinta. Mais famoso, mais importante e mais sedutor: no açúcar estava uma fonte de riqueza quase igual ao ouro.

        Outras uniões não tardaram a verificar-se à sombra da cana-de-açúcar: algumas delas na culinária. Entre o açúcar e a fruta do mato tropical, por exemplo. Entre o açúcar e a mandioca. Entre o açúcar e quanto produto do trópico foi se prestando a ser cozinhado em tachos até tornar-se doce ou quitute de uma nova espécie, alimento meio português, meio tropical, agradável ao paladar, além de nutritivo. Uniões a que foram sendo acrescentadas a canela do Oriente, o cravo, a noz-moscada.” 

Gilberto Freyre. Açúcar. SP: Companhia das Letras. 1997 (1ª edição 1939)


Benedito Calixto de Jesus,
Moagem de Cana Fazenda Cachoeira. Campinas,1830.

[10] Casas que não são vistas pelo Ascendente são as que não fazem com ele os aspectos ptolomaicos: sextil (60°), quadratura (90°), trígono (120°) e oposição (180°).

[11] Os lotes são pontos no mapa, localizados a partir da relação entre dois planetas: a distância em graus entre eles, na circunferência do mapa, forma um arco, e este arco é projetado a partir do Ascendente, que afinal é o início de tudo, e o grau marca sua outra extremidade define o Lote Árabe. Existem lotes para inúmeros temas. O Lote da Fortuna é um deles, resultado da relação entre Sol e Lua. Como nos mapas de início de lunação os luminares estão juntos, sua distância é zero, e o Lote coincide com o grau do Ascendente.

O lote da Memória, citado no texto, é relação entre os planetas Lua e Marte 

Asc + Marte - Lua - mapa diurno 

Asc + Lua - Marte - mapa noturno 


[12] High on the hog - Da África aos EUA: Uma Jornada Gastronômica https://www.netflix.com/br/title/81034518 

https://www.amazon.com/High-Hog-Culinary-Journey-America/dp/1608194507


Menu-lunação Câncer 

Cuscuz paulista 

Arroz branco 

Gumbo 

Compota de fruta


CUSCUZ PAULISTA 

Um resumo simplista do cuscuz é: um molhão de tomate com ingredientes (palmito, ervilha etc) engrossado com farinha de milho.

        Começamos preparando o molho:

        Descascar os tomates: gosto de fazer isso na boca do fogão, se não forem muitos. Cortar algumas rodelas mais firmes e reservar para a decoração;

        Fazer suar cebola picada e louro; quando a cebola estiver translucida adicionar alho picado e antes que fique muito tostado os tomates picados e extrato de tomate. Esse molho tem que ficar bem forte pois vai ter que temperar toda a farinha que entrar;

        Acrescentar então os ingredientes mais duros: vagem, ervilha congelada (esta é uma mudança da receita da família, que leva ervilha em lata);

        Enquanto essas coisas cozinham, pode-se ir picando: palmito em conserva (em pedaços não muito pequenos porque eles se desmancham com muita facilidade), e, se quiser, descaroçar azeitonas. Também é o momento de decorar a forma com as rodelas de tomate, palmito, cebola, como quiser. Essa decoração tem a função de facilitar na hora de desenformar o cuscuz, então não pule essa parte. Deixe tudo pronto antes de colocar a farinha;

        Quando a ervilha e vagem estiverem no ponto, acrescentar esses ingredientes mais macios;

        Temperar com sal e pimenta. Deixar o tempero forte para que não suma quando acrescentar as farinhas;

        Tudo pronto, acrescentar um pouco de farinha de mandioca e deixar absorver bem (minha tia não colocava farinha de mandioca, mas eu coloco e acho que dá uma textura muito boa);

        Então acrescentar aos poucos farinha de milho amarela (bijú) e mexer. Até você perceber que ele formou um corpo, não chega a desgrudar do fundo da panela como um brigadeiro mas já não é uma massa gosmenta.

        Apagar o fogo e acrescentar um pouco de azeite e misturar bem, com delicadeza; eu que gosto de comidas pedaçudas sempre prefiro mexer o mínimo possível pra não perder os pedaços.

        Antes que esfrie coloque na forma preparada e espere um pouquinho pra firmar e desenformar.

pimenta cumari


GUMBO 

roux

1/2 xíc farinha de trigo 

1/2 xíc óleo vegetal


santíssima trindade: 

1/2 xíc cebola picadinha 

1/2 xíc salsão picadinho 

1/2 xíc pimentão picadinho


6 dentes de alho 

1/2 xíc salsinha 

1/2 xíc cebolinha 

louro 

1 lata de tomates pelados 

4 xíc caldo de legumes 

4cc tempero cajun (abaixo)

900g de ingredientes para morder: salsão, pimentão, quiabo, cenoura, vagem, couve flor, embutido de feijão, já fritinho (receita segue abaixo)


O nome do prato, gumbo, é a palavra para quiabo. O quiabo é usado para engrossar o prato, além do roux. Como a época dele é tão curtinha, tive que usar inhame para uma babinha, e ficou super bom.

Também usei uma coisa que comprei como “bacon vegano”, mas que não é um bloco de gordura, é uma massa de batata bem durinha defumada. Quem conhece konnyaku, da comida japonesa, imagina um konnyaku defumado. Bem interessante. 


        Coloque o óleo para esquentar (sugiro uma panela clara para acompanhar com segurança a mudança da cor), em seguida a farinha, mexendo. Continue mexendo. A farinha vai fritando e ganha um tom bege, então castanho e o que mostram as receitas é que o ideal é da cor de chocolate, eu nunca consegui chegar até lá porque sempre tenho a sensação de que vai queimar. Mas é assi mesmo para nós amadores da culinária cajun. Marte me dê mais coragem na próxima vez. A cor dessa farinha define a cor final do seu gumbo. Isso leva vários minutos.

        Então acrescente a santíssima trindade, em fogo baixo, continue mexendo. Quando a cebola estiver translúcida, junte o alho, a cebolinha e a salsinha também picadas e deixe o alho cozinhar. Então o louro, os tomates em pedaços e o tempero cajun.

        É hora de diluir essa massa: junte aos poucos o caldo quente, mexendo. Quando todo o caldo for adicionado, mexa de vez em quando para que não empelote até que engrosse. Deixe para ajustar o sal ao final. 

        Quando o molho estiver mais grosso grosso acrescente os pedaços de morder, cada um a seu tempo, e deixe-os cozinharem até o ponto de sua preferência. Se for usar o embutido, frite-o à parte antes de acrescentar. O inhame deve ser cozido antes, inteiro, com casca, então descascado, cortado.

        “Cada um a seu tempo” quer dizer o seguinte: alguns ingredientes, como a vagem demoram mais para cozinhar do que a ervilha torta, por exemplo. Coloque o que demora mais, acrescentando os outros em ordem. A linguiça, o bacon-konnyaku e o inhame podem ir na metade.

        Um dos vídeos que me ensinou foi esse.


TEMPERO CAJUN 

misture num potinho e use apenas o necessário em cada receita: 

2 1/2 cS páprica doce 

2 cS sal 

1 cS pimenta do reino preta 

1 cS pimenta caiena 

1 cS orégano 

1 cS tomilho


EMBUTIDO VEGANO

A receita é daqui mas como mudei alguma coisa, aqui vai a minha versão, muito parecida:

½ xícara de feijão preto cozido. Eu deixei o feijão germinar uns 4 dias antes de cozinhar. 

¾ xícara de chá de funcho (a receita dizia caldo de vegetais e o funcho era acrescentado moído, mas não tenho moedor e ia ficar muito ruim de mastigar, então optei pelo chá, mas faça bem forte)

1 cS azeite de oliva 

1 ½ cS de shoyu 

2 dentes de alho bem picados 

1 xíc de farinha de glúten 

1 cc de pimenta calabresa (pode ser a caiena, um pouco menos) 

1 cc de páprica defumada (gostaria de ter colocado mais) 

1 cc tomilho seco 

Pimenta do reino 

1cc coentro em pó

Preparar uma panela para cozimento a vapor 

Amassar o feijão ou passar por uma peneira 

Juntar a ele os líquidos mas não todo o chá, para ir acrescentando o glúten aos poucos, intercalando com o chá, pois ele fica durinho e não é bom ficar sovar muito. 

Dividir em 3 partes e embrulhei em papel alumínio e coloque para cozinhar na panela de vapor. 


COMPOTA DE MAMÃO VERDE 

daqui

Essa receita é uma base. Na falta de mamão verde, faça com o que tiver: abóbora, fruta...

1 kg de mamão verde 

1 ½ kg de açúcar 

2 xícaras (chá) de água 

½ colher (chá) de bicarbonato de sódio

Descasque e corte o mamão ao meio. Descarte as sementes, apóie a metade do mamão sobre uma tábua e corte fatias bem finas, no sentido do comprimento. Repita com a outra metade.

Encha uma panela com água, acrescente o bicarbonato e leve ao fogo médio. Quando ferver, coloque as tiras de mamão e deixe cozinhar por 1 minuto.

Escorra o mamão e despreze a água. Reserve as tiras.

Na panela, coloque o açúcar e as 2 xícaras (chá) de água. Leve ao fogo alto e deixe ferver por 3 minutos. Coloque as tiras de mamão na calda e deixe cozinhar por mais 1 minuto. Desligue o fogo.

Quando o doce esfriar, transfira para vidros de conserva esterilizados (veja abaixo como esterilizar vidros). Deixe o doce descansar por 12 horas antes de servir.


LISTA DE COMPRAS 

para quatro pessoas 

Feira: 

tomate 1 un para forma do cuscuz 

alho 

cebola 2 un pequenas 

louro 

vagem 

salsão 

pimentão 1 un 

salsinha 

cebolinha 

brócolis 

cenoura 

quiabo ou inhame 

fruta para compota

Secos e molhados: 

arroz branco 

passata de tomate 

tomate em lata 

pimenta cumari 

ervilha congelada 

palmito 

azeitona verde 

farinha de mandioca fina 

farinha de milho em flocos 

farinha de trigo 1/2 xíc 

óleo 

páprica doce 

pimenta do reino 

pimenta caiena 

orégano 

tomilho 

compota de fruta ou fruta, açúcar e bicarbonato 

linguiça vegana (ou ver abaixo) 

bacon vegano para o embutido: 

feijão preto 

chá de erva doce 

shoyu 

alho 2 dentes 

farinha de glúten (1 xic) 

pimenta calabresa (opcional) 

páprica defumada 

tomilho seco 

coentro em pó 

papel alumínio

        

[texto enviado na data da lunação para apoiadores, publicado aqui em 05/01/25]

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